Apostas no Brasil: O que aprendemos após meio ano de regulamentação?

Em um artigo exclusivo para o UOL Apostas, a diretora de operações da Betsul analisa os efeitos do mercado regulamentado das apostas no Brasil.
Nesse texto, Andréia Oliveira explora os avanços significativos e alerta para os desafios colocados às bets.
O que aprendemos após meio ano de regulamentação?
Seis meses após a entrada em vigor da regulamentação das apostas no Brasil, o setor de casas de apostas regulamentadas, conhecidas como “bets”, tem experimentado avanços significativos, mas também enfrenta desafios consideráveis. A Lei 14.790/2023, sancionada em dezembro de 2023, estabeleceu as bases legais para as apostas de quota fixa, tanto em eventos esportivos quanto em jogos de azar online, como caça-níqueis e roletas.
Essa legislação introduziu diretrizes rigorosas para métodos de pagamento, cadastro com reconhecimento facial, atendimento ao cliente, publicidade e medidas para prevenir a lavagem de dinheiro e fraudes.
Desde a implementação da regulamentação, houve progressos notáveis na estruturação do mercado. Em outubro de 2024, o Ministério da Fazenda atualizou a lista de empresas autorizadas a operar no país, totalizando 96 organizações com 213 casas de apostas liberadas e segue avançando.
Essas empresas passaram a operar sob regras mais claras, com exigências de comprovação de habilitação jurídica, regularidade fiscal e trabalhista, além de qualificação técnica e econômico-financeira. A portaria normativa 1.330, publicada em outubro de 2023, detalhou aspectos relacionados à exploração do setor, publicidade, jogo responsável, direitos do consumidor e combate à lavagem de dinheiro.
Desafios enfrentados
Apesar dos avanços, o setor enfrenta desafios significativos. Um estudo do BetBox TV revelou que 30,7% das casas de apostas autorizadas não oferecem suporte eficiente aos usuários, comprometendo a experiência de apostas e colocando em risco a segurança financeira dos jogadores.
Além disso, 10% das plataformas estavam fora do ar, dificultando o acesso dos apostadores aos serviços.
Plínio Lemos Jorge, presidente da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), reconheceu que muitas plataformas ainda estão em processo de adaptação às novas exigências governamentais.
Outro desafio é a sustentabilidade financeira das casas de apostas. Estima-se que apenas 15% das empresas atuais terão recursos suficientes para se adaptar à nova realidade regulatória.
José Venâncio, sócio da Hand, uma assessoria especializada, afirmou que muitas empresas podem não ter capacidade financeira para cumprir as exigências legais, o que pode levar à consolidação do mercado.
Perspectivas de ajustes nas portarias
Especialistas apontam que, embora a regulamentação seja um avanço, algumas medidas podem ser consideradas brandas em relação a padrões internacionais. Por exemplo, as restrições de publicidade e horários de jogo são vistas como insuficientes para prevenir problemas relacionados ao jogo compulsivo.
Além disso, há críticas sobre a falta de investimentos em saúde para tratar dependentes do jogo. A legislação atual prevê que, a partir de 2025, as casas de apostas pagarão 12,5% de imposto sobre os lucros, com 2,5% destinados ao tratamento da ludopatia. No entanto, associações do setor alertam que essa alta taxação pode afastar empresas sérias, favorecendo a ilegalidade.
Diante desses desafios, é provável que haja ajustes nas portarias e regulamentações. A necessidade de um equilíbrio entre a geração de receita, a proteção ao consumidor e a sustentabilidade do mercado exigirá revisões contínuas das políticas públicas. A colaboração entre autoridades governamentais, operadores do setor e especialistas será essencial para aprimorar a regulamentação e assegurar um ambiente de apostas seguro e transparente no Brasil.
A mídia tem destacado diversos aspectos da regulamentação das apostas no Brasil. Matérias como “Governo avança na regulamentação do mercado de apostas online” abordam as medidas adotadas pelo Ministério da Fazenda para estruturar o setor e garantir a integridade das operações.
Além disso, reportagens como “Regulamentação das apostas: quais os desafios enfrentados no Brasil e no mundo?” Discutem as críticas às atuais diretrizes e a necessidade de ajustes para atender aos padrões internacionais de proteção ao jogador e prevenção ao jogo compulsivo.
Inteligência Artificial e o novo perfil do apostador
Com o avanço tecnológico, muitos apostadores passaram a usar ferramentas de inteligência artificial (IA) para analisar dados e otimizar suas apostas esportivas. Essa prática tem desafiado as casas de apostas a adaptarem seus sistemas para lidar com estratégias mais sofisticadas dos usuários.
As casas de apostas enfrentam o dilema de equilibrar a experiência do usuário com a necessidade de manter a sustentabilidade financeira. Algumas plataformas têm recorrido a limitações de movimentações ou até bloqueios de contas de apostadores que utilizam IA de forma intensiva. No entanto, tais medidas podem acarretar riscos legais, especialmente se forem consideradas práticas discriminatórias ou se violarem os direitos dos consumidores.
Para evitar prejuízos e manter a conformidade legal, as casas de apostas podem investir em tecnologias de monitoramento que identifiquem padrões de comportamento suspeitos, além de promover transparência nas regras e políticas de uso. A colaboração com órgãos reguladores e a adoção de práticas de jogo responsável também são estratégias recomendadas para enfrentar os desafios impostos pela utilização de IA pelos apostadores.
Em suma, os seis meses de regulamentação das apostas no Brasil mostraram avanços significativos na estruturação do mercado, mas também evidenciaram desafios que exigem atenção contínua. A evolução do setor dependerá da capacidade de adaptação dos operadores às novas exigências legais e da eficácia das políticas públicas em equilibrar os interesses econômicos com a proteção dos consumidores.
Na prática, conversando com alguns operadores, o mercado tem buscado se adaptar rapidamente ao novo ambiente, mas apontam o desafio de manter o equilíbrio financeiro frente às exigências regulatórias. O investimento necessário para se manter em conformidade é alto: equipes de compliance, auditorias frequentes, plataformas estáveis e ações de marketing responsáveis tornaram-se itens obrigatórios.
Ao mesmo tempo, a concorrência aumentou, o que exige ainda mais inovação, eficiência e diferenciação de marca. Há também uma preocupação com a velocidade das mudanças e a necessidade de previsibilidade nas futuras atualizações das portarias.
Ainda assim, a maioria dos operadores considera a regulamentação um passo positivo e necessário para a profissionalização do setor. Com ajustes graduais, diálogo transparente com o governo e foco no consumidor, a expectativa é de que o mercado brasileiro se torne referência na América Latina por ser seguro, sustentável e competitivo. Esperamos que a fiscalização se intensifique contra as bets não reguladas e que o mercado se torne mais coerente – mas isso é tema para uma próxima reflexão.