Alê Youssef

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Opinião

Antes tarde do que nunca: a recriação da Secretaria de Economia Criativa

Depois do grave erro cometido pela equipe de transição de governo da área da Cultura — pouco antes da posse do Presidente Lula —, que extinguiu a Secretaria de Economia Criativa do Ministério da Cultura e embaralhou suas funções com a área de fomentos culturais , revelando a falta de compreensão da importância desse assunto e um certo desdém em relação à necessidade de atualização da politica cultural, agora, 2 anos e meio depois, o governo acertadamente corrige o lapso da transição e recria a Secretaria.

O decreto do final da semana passada estabelece que, entre suas funções, estão implementar políticas, programas e ações para o desenvolvimento da economia criativa brasileira e de seus trabalhadores, em articulação com outras unidades do Ministério da Cultura, demais órgãos e entidades governamentais e não governamentais; criar programas e ações para a produção de dados e informações sobre a economia criativa brasileira; subsidiar as demais unidades do Ministério na formulação de políticas para a promoção da economia criativa brasileira; e desenvolver e institucionalizar os territórios criativos e seus modelos de governança.

Como alertamos por diversas vezes nesse espaço, claro que uma agenda tão importante e abrangente deveria ter se iniciado já no primeiro dia da atual gestão. A urgência da valorização da economia criativa foi prejudicada por essa enorme demora na retomada do órgão responsável por tudo isso.

Além disso, muitos assuntos estruturantes que afetam a relação da cultura com a economia já foram tratados pelo governo e a ausência de um espaço institucional responsável contribuiu para que decisões tenham sido tomadas sem o olhar cultural. As políticas de crédito já estabelecidas e a própria reforma tributária são exemplos disso.

Entretanto, mesmo com o atraso e com alguns processos difíceis de serem revertidos, é importante louvar a dedicação da ministra Margareth Menezes e de sua equipe, em busca da recriação desse órgão. Não foi fácil lidar com a sabotagem do "fogo amigo cultural" — quando extinguiram a secretaria pela canetada da comissão de transição — nem com a lentidão da máquina pública federal para conseguir fazer a correção necessária.

Outro ponto positivo é que, em meio ao turbilhão que é gerir um órgão tão complexo, capilar e exposto às inúmeras demandas práticas e ideológicas da classe cultural, como o MinC, houve escuta e sensibilidade para reconhecer que o caminho não estava sendo trilhado de forma completa, sem a dimensão da economia criativa na formulação da macropolítica.

Os desafios são enormes e urgentes. A necessidade de construção de propostas para regulamentação das profissões da cultura, uma guinada na política de formação profissionalizante para oferecimento de cursos derivados das profissões da economia criativa e um amplo programa de crédito que agite de forma contundente todo o empreendedorismo cultural brasileiro são alguns dos passos que precisam ser dados com convicção.

Ainda temo — depois de tudo o que já assistirmos — o dirigismo ideológico que nega o setor privado e insiste na narrativa que a cultura, ao contrário de todas as outras áreas, deve ser gerida apenas pelo dinheiro público direto do orçamento. As parcerias público privadas que precisam estar presentes também no ambiente cultural.

Essa turva visão ultrapassada também tem dificuldade em compreender as novas expressões da cultura popular e reconhecer a importância das grandes cidades brasileiras — que concentram o maior potencial da economia criativa. As forças econômicas da criatividade, tanto do mercado cultural, como da cultura efervescente nas periferias das grandes cidades são estratégicas e não podem ser ignoradas.

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Torço para que a equipe escolhida para gerir a nova Secretaria tenha essa cabeça aberta para o novo e pense com o calendário de 2025 — e não com as referências do passado.

Claudia Leitão, indicada como secretária e a quem desejo toda sorte na missão, tem muito conhecimento técnico e já exerceu a mesma função anteriormente no governo Dilma Rousseff. Importante ressaltar que o tema ganhou muita força e relevância no Brasil e em todo o mundo de lá pra cá.

Dava como oportunidade perdida a possibilidade da cultura estar no eixo de desenvolvimento econômico, social e sustentável do país. Agora, vendo a correção de rumo, mesmo com pouco tempo de governo pela frente e com os tantos problemas que foram acumulados, retomo alguma esperança, especialmente pelo retorno do espaço institucional e por diretrizes que podem ser desenhadas para um futuro diferente, a partir daí. Antes tarde do que nunca.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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