Ricky Hiraoka

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Opinião

'Jogo da Viúva': filme mais visto da Netflix renderia ainda mais como série

Além de bons melodramas e suspenses, o audiovisual espanhol tem sido uma fonte para saciar a fome dos espectadores viciados em histórias baseadas em crimes verdadeiros. Sejam ficcionais ou documentais, as produções true crime da Espanha são instigantes e, em sua grande maioria, não lançam mão de artifícios simplistas para tornar a trama mais palatável para o grande público, como fez o filme nacional "O Maníaco do Parque", por exemplo.

O mais novo exemplar da safra espanhola de true crime é o longa-metragem "Jogo da Viúva", que, desde que estreou na Netflix na última sexta-feira, ocupa a primeira posição entre os filmes mais vistos da plataforma. Inspirado no assassinato do engenheiro Antonio Navarro, o caso ficou conhecido como o Crime de Patraix, uma referência ao bairro de Valência onde a vítima morava e foi morta após ser apunhalada oito vezes.

Por ter acontecido em 16 de agosto de 2017, um dia antes do atentado que ocorreu em Las Ramblas, de Barcelona, que matou 13 pessoas e feriu outras 100, o Crime de Patraix não gerou uma comoção midiática imediata, mas ganhou as manchetes de jornais e emissora de TV quando a polícia provou que a viúva, Maria Jesus Moreno, mais conhecida como Maje, foi quem planejou a execução do marido, Antonio, e delegou a tarefa a um de seus amantes, Salvador, com quem trabalhava em um hospital.

Em pouco mais de duas horas, "Jogo da Viúva" mostra a perspectiva dos três protagonistas dessa trama: a investigadora Eva (Carmen Macchi), a mentora intelectual do crime, Maje (Ivana Baquero), e Salvador (Tristán Ulloa), que deu cabo na vida de Antonio (Álex Gadea). A construção da narrativa por três pontos de vistas distintos é bem eficaz, criando uma tensão constante e crescente.

Ivana Baquero em cena no filme "Jogo da Viúva", da Netflix
Ivana Baquero em cena no filme "Jogo da Viúva", da Netflix Imagem: Jogo da Viúva Netflix

Honesto e bem estruturado, o filme, certamente, satisfaz os fãs de suspense policial, mas a opção por contar essa história real através de um longa não permite que alguns aspectos desse caso sejam aprofundados. Teria sido mais interessante se "Jogo da Viúva" fosse uma série limitada.

Uma narrativa mais extensa daria chance aos criadores da produção esmiuçar em mais detalhes a complexidade psicológica de Maje, uma mulher criada sob forte repressão religiosa que encontrou na sexualidade uma forma de autoexpressão e de validação. Maje mantinha vários casos extraconjugais simultaneamente e adaptava sua personalidade para seduzi-los. Ela mentia e manipulava as pessoas com facilidade. A vida dupla de Maje, porém, não tem tanto espaço nas duas horas de "Jogo da Viúva".

Mais tempo de tela também possibilitaria entender melhor a mente de Salvador, que se deixou manipular pela amante, e de cidadão exemplar e pai de família, tornou-se um assassino capaz de planejar e executar um crime de modo a não deixar quase nenhum vestígio. Não fosse um único deslize que ele e Maje cometeram, talvez, ambos nunca fossem presos pela morte de Antonio.

Se fosse uma série, "Jogo da Viúva" poderia ter abarcado outros eventos interessantes relacionados ao Crime de Patraix. Enquanto aguardavam o julgamento, Maje e Salvador seguiram conectados, trocando cartas de amor, em que ele jurava que iria protege-la de tudo. Salvador só mudou sua postura quando descobriu que a amante mantinha relacionamento com outros detentos. Posteriormente, após ser condenada a 22 anos de reclusão, Maje manteve uma vida amorosa ativa atrás das grades e engravidou de David, condenado por assassinato. Ela deu à luz na penitenciária em 2023, onde cria seu bebê.

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