Dificuldade para fazer cocô pode ser disquesia; entenda a condição

A disquesia do lactente é uma situação frequente e transitória em bebês com menos de nove meses —lactente se refere à criança que ainda está na fase de amamentação.

Ela ocorre porque o bebê ainda não aprendeu a coordenar corretamente os músculos do assoalho pélvico e do ânus para evacuar sem esforço. Como resultado, ele pode fazer força excessiva ao tentar defecar, mesmo que as fezes não estejam endurecidas.

Esse problema acontece porque, para evacuar, o reto (a parte final do intestino grosso) precisa se contrair ao mesmo tempo que o ânus relaxa. No entanto, nos primeiros meses de vida, essa sincronização ainda não está bem desenvolvida. Com o tempo e o amadurecimento neuromuscular, o bebê aprende a controlar esses movimentos naturalmente, sem a necessidade de tratamento.

Já nos adultos, a disquesia está mais para um distúrbio funcional do intestino, havendo algum problema persistente na coordenação dos músculos do assoalho pélvico e do esfíncter anal. Isso pode levar à constipação crônica e, ao contrário dos bebês, dificilmente melhora sem intervenção de especialistas.

Quais as causas do distúrbio

A disquesia em bebês acontece porque o sistema neuromuscular ainda está em desenvolvimento e não consegue coordenar corretamente os músculos envolvidos na evacuação. Quando um bebê sente vontade de fazer cocô, o cérebro manda sinais para os músculos do abdômen fazerem força, mas ao mesmo tempo, ele ainda não sabe relaxar os músculos do assoalho pélvico e abrir o esfíncter anal (a pequena "válvula" que controla a saída das fezes).

Esse descompasso faz com que o bebê force bastante e sinta muito desconforto, mesmo que as fezes sejam macias/amolecidas e normais. Como o sistema neuromuscular vai amadurecendo ao longo dos meses, o bebê naturalmente aprende a coordenar esses movimentos, e o problema desaparece sem precisar de tratamento.

Em adultos, a disquesia costuma estar ligada a problemas de saúde que dificultam a evacuação. Algumas das causas mais observadas incluem:

  • Anismo: quando os músculos que deveriam relaxar para a saída das fezes, na verdade, se contraem involuntariamente, dificultando a evacuação;
  • Hemorroidas: veias inchadas no ânus que podem causar dor e sangramento ao evacuar;
  • Fissuras anais: pequenos cortes na pele do ânus, que provocam dor intensa e podem levar à dificuldade de evacuar por medo da dor;
  • Endometriose: doença em que o tecido que normalmente reveste o útero cresce em outras partes do corpo, podendo afetar o intestino e causar dor na evacuação;
  • Doença inflamatória intestinal: inclui condições como a retocolite ulcerativa e a doença de Crohn, que inflamam o intestino e podem provocar diarreia, dor e dificuldade para evacuar;
  • Pólipos no cólon: pequenos crescimentos na superfície interna do intestino grosso que podem dificultar a passagem das fezes;
  • Tumores: alguns tipos de câncer no intestino ou reto podem causar bloqueios e tornar a evacuação difícil;
  • Pubalgia: inflamação nos músculos, tendões ou articulações da região púbica, geralmente causada por esforço repetitivo, má postura ou sobrecarga. Como a dor nessa área pode afetar o assoalho pélvico, dificulta o relaxamento do esfíncter anal e causa disquesia;
  • Distúrbios neurológicos ou psicológicos: lesões na medula espinhal, esclerose múltipla, Parkinson, estresse crônico, ansiedade e depressão são condições que podem afetar o funcionamento do intestino e dificultar a evacuação.
Continua após a publicidade
Imagem
Imagem: iStock

Sintomas que fazem chorar

Embora comum e temporária, a disquesia em bebês é uma condição que pode deixar os pais preocupados. Os sinais mais comuns são:

  • O bebê fazer muita força para evacuar, mas sem sucesso imediato, o que pode causar dor e desconforto;
  • Mesmo que as fezes estejam normais e amolecidas, ele pode chorar excessivamente;
  • Em alguns casos, é possível que se contorça ou até mesmo dê chutinhos;
  • Enquanto tenta eliminar as fezes, seu rosto pode ficar vermelho pelo esforço.

Esses episódios de esforço intenso para evacuar costumam ter duração entre 10 a 20 minutos, podendo se repetir ao longo do dia, principalmente nos primeiros meses de vida, à medida que o sistema nervoso do bebê ainda está se desenvolvendo e aprendendo a coordenar a evacuação.

Nos adultos, a disquesia se refere mais à dificuldade ou ao esforço exagerado para evacuar, com sensação de evacuação incompleta. Como já citado, pode ser um sinal de problemas de saúde mais complexos, como questões relacionadas ao intestino, ao esfíncter anal ou até à musculatura pélvica, que precisam de avaliação profissional adequada.

Continua após a publicidade

Diagnóstico muda conforme idade

O diagnóstico de disquesia em bebês é feito por um pediatra, que avalia os sinais e sintomas apresentados, além de considerar o histórico de saúde da criança. O médico ainda orienta os pais sobre os cuidados e o acompanhamento da condição. Geralmente, não são pedidos exames adicionais, pois a disquesia é uma condição comum, benigna e transitória nos primeiros meses de vida.

Em se tratando de adultos, o diagnóstico é feito por meio da análise dos sintomas e do histórico médico. Estudos de trânsito colônico e exames de sangue, colonoscopia, ou manometria anorretal podem ser solicitados por um gastroenterologista ou coloproctologista para investigar condições subjacentes ou avaliar a função do sistema digestivo.

No consultório, o médico pode realizar ainda um exame retal (também chamado de toque retal). Esse procedimento simples é feito com um dedo do médico, protegido por uma luva e lubrificado, para examinar a região do ânus, reto e a parte inicial do intestino. Ele ajuda a identificar possíveis problemas nessas áreas.

Tratamento pode ou não exigir intervenções

O tratamento da disquesia em bebês geralmente é feito de maneira tranquila e sem a necessidade de intervenções sérias ou invasivas. Isso se deve ao fato de que, em muitos casos, a condição é passageira, causada pela imaturidade do sistema nervoso e falta de coordenação na evacuação.

Continua após a publicidade

Em alguns casos bem pontuais, o médico pode recomendar medicamentos (antiespasmódico, probiótico, agente antiflatulento) para ajudar a aliviar o desconforto causado pela disquesia ou cólicas em bebês, mas isso dependerá do quadro específico e das necessidades individuais.

Quando se utilizam métodos como supositórios, laxantes ou estimulação retal, o bebê pode se acostumar com esses estímulos externos e passar a depender deles, sem aprender a ativar corretamente seus músculos internos para evacuar. Portanto, são desaconselháveis e só devem ser utilizados com recomendação e orientação médica.

Algumas medidas não medicamentosas também podem ser adotadas, como:

  • Segurar o bebê no colo, abraçá-lo, acariciá-lo, conversar com ele ou até cantar músicas calmas podem ajudar a tranquilizá-lo. Esses gestos promovem o conforto emocional e podem aliviar a tensão muscular;
  • Um banho de água morna pode relaxar os músculos e ajudar no alívio da dor e do desconforto;
  • A introdução de alimentos sólidos deve ser feita aos seis meses, momento em que o sistema digestivo do bebê está mais preparado para lidar com esse tipo de alimentação e a mudança na evacuação;
  • Massagens suaves na barriga do bebê ajudam a melhorar a circulação, a coordenação entre o cérebro e o corpo e os movimentos intestinais, o que facilita o processo de evacuação;
  • Flexionar as perninhas do bebê em direção à barriga também pode aliviar a pressão no assoalho pélvico e ajudar a relaxá-lo durante a evacuação.

Por outro lado, em adultos, como a disquesia geralmente está associada a condições mais complexas, como problemas musculares, doenças intestinais ou até fatores psicológicos, o tratamento pode variar. Pode abranger desde o uso de medicações, como laxantes ou analgésicos; realização de fisioterapia para melhorar a coordenação muscular e o relaxamento do assoalho pélvico; e em alguns casos, quando há um problema físico mais sério, como obstruções ou lesões, considera-se a realização de cirurgia.

Fontes: Rodrigo Barbosa, cirurgião do aparelho digestivo pela Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba e especialista em coloproctologia; Mariana Lombardi Novello, pediatra pós-graduada em neurociência, educação e desenvolvimento infantil pela PUC-RS; Nelson Douglas Ejzenbaum, pediatra pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e neonatologista.

Deixe seu comentário

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.